2. Poder Punitivo - de imposição de sanção disciplinar - processo:
Resta claro que o Estado, para exercer seu Poder Punitivo, há de promover o Devido Processo Legal, “due processo of Law”, procedimento de apuração regular da falta, ou seja, um processo de punição, “com o objetivo de apurar infração à lei ou contrato, cometida por servidor, administrado, contratado ou por quem estiver submetido a um vínculo especial de sujeição, e aplicar a correspondente penalidade”.1
Urge destacar, cumprir e respeitar sempre o Direito Fundamental da dignidade da pessoa humana, como leciona Franzé in Prova ilícita frente à dignidade da pessoa humana2, amparando-se nos escólios de José Afonso da Silva3 e Ada Pellegrini Grinover4, a saber:
“(...) para o processo atingir a sua função maior de alcançar a justiça e, consequentemente, preservar a dignidade da pessoa humana, é imprescindível que seja visto em sua fase instrumentalista, por meio da lente da Constituição e mediante uma interpretação que faça uso do princípio da proporcionalidade, (...)”
(...) o direito processual deve amparar qualquer lesão ou ameaça a direito.
(...) E diante desta amplitude, o processo deve se pautar pelo devido processo legal, além de assegurar as formas instrumentais adequadas para entregar a tutela jurisdicional, dando a cada um o que lhe pertence e nada mais, para que seja alcançada a almejada ordem jurídica justa.”- Sem grifos no original
Eu diria mais, ainda: tão só e somente só aplicar a correspondente SANÇÃO, pois penalidade só o poderá o juiz na esfera judicial, sempre após o DEVIDO PROCESSO LEGAL, com garantias do Contraditório, AMPLA DEFESA e todos os meios e recursos a ela inerentes, dês que tenha havido infração à LEI ou a contrato imputado ao inativo castrense estadual caetés – vide mais sobre o tema, de nossa Autoria, o singelo texto: SANÇÃO ADMINISTRATIVA DISCIPLINAR DESMOTIVADA E SEM FUNDAMENTAÇÃO LEGAL É ARBÍTRIO. 5
Aliás, em sentido semelhante também é o ensinamento de Reinaldo Moreira Bruno no seu Direito Administrativo Didático ao tratar de processo disciplinar, a saber:
Na ocorrência de infração aos deveres funcionais estabelecidos nos diversos estatutos, estar-se-á diante do denominado ‘ilícito administrativo’, que impõe ao administrador o ônus de exercitar o poder disciplinar, apurando os fatos, assegurando a ampla defesa e o contraditório, e, afinal, promovendo a eventual punição. Sem grifos no original.
Note-se, tão-só, somente só e apenas havendo incidência de INFRAÇÃO ao dever funcional que se cogita o imperativo exercício do dever-poder disciplinar de apurar os fatos, dês que assegurados os Direitos-Garantias Fundamentais, conforme José Afonso da Silva e os autores acima.
Logo, inexistindo infração ao DEVER FUNCIONAL inaceitável, inadmitida e descabida quaisquer sanções disciplinares, mormente se NÃO-APURADAS mediante devido processo legal, no caso de havida falta disciplinar. Havendo, por sua vez, é dever-poder do Administrador exercer seu poder disciplinar, sob pena de sua omissão caracterizar crime previsto no Art. 320 do CP – condescendência criminosa.
Restando claro que “o rompimento da estabilidade dos servidores públicos e a consequente interrupção do vínculo jurídico”, com a Administração, só devem ocorrer mediante apuração6 processo administrativo de natureza disciplinar ou sentença judicial transitada em julgado, conforme império do Art. 41, §1, I e II, da CF/88.
Com efeito, há assegurado o Direito-Garantia ao servidor concursado, até mesmo ao servidor indiligente, desidioso, contumaz transgressor ou descumpridor de seus deveres, de somente se ter rompida sua estabilidade ou cessado seu vínculo jurídico com a Administração depois de conclusos processos administrativo de natureza disciplinar ou judicial, que decidam pela perda de vínculo jurídico funcional ou de sua estabilidade.
Note-se que a CF/88 assegura o direito-garantia ao servidor civil concursado de somente perder sua estabilidade e de quebrar seu vínculo jurídico funcional após o devido processo legal que assim finde, conclua, decida e haja sentença que transite julgado. Por sua vez, o servidor castrense estadual também é concursado e deve ter assegurado o mesmo Fundamental Direito-Garantia.
Todavia, ao castrense estadual caetés, somente depois de condenado por sentença judicial restritiva de liberdade superior a dois anos transitada em julgado é que deverá ser submetido ao Processo Administrativo7 de natureza Disciplinar ou Justificação, sendo praça ou oficial, respectivamente, para perder ou quebrar sua estabilidade ou vínculo jurídico, cf Art. 125, §4º “Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças”. c/c Art. 142, §3º, VI e VII, da CF/88 – vide nosso ensaio sobre tema (Sanção administrativa desmotivada é arbítrio)
Mas a CF/88 silencia, omite e nada fala sobre o servidor diligente, dedicado, disciplinado e cumpridor de seus deveres que completa, cumpre e exaure seu tempo mínimo ou máximo compulsório de aposentadoria, que, dessarte, consegue, conquista, adquire e faz jus ao direito-garantia de desobrigar-se, desligar-se e desvincular-se jurídica, funcional e administrativamente das atribuições do cargo que até então exercia na da Administração Pública, ao ter e ver editado Ato Administrativo do Direito-Garantia – Ato de Aposentadoria - no Diário Oficial do Estado aposentando-o ou transferindo-o à Reserva Remunerada.
1 Gasparini, Diógenes. Direito administrativo. P. 568.
2 Franzé, Luís Henrique Barbante. Prova ilícita frente à dignidade da pessoa humana in Gramática dos direitos fundamentais. P.92/95.
3 Para isso, como bem lembra José Afonso da Silva, sempre necessárias a garantia do contraditório, o pleno direito de defesa, a isonomia processual e a bilateralidade dos atos procedimentais (Curso de direito constitucional positivo, 19. Ed. São Paulo: Malheiros, p.565)
4 Como adverte Ada Pellegrini Grinover: vãs seriam as liberdades do indivíduo, se não pudessem ser reivindicadas, e defendidas em juízo. (Garantia constitucional do direito de ação, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1973, p.17)
5 Vide URLs http://djuris.br.tripod.com/ e http://jus.uol.com.br/revista/autor/joilson-fernandes-de-gouveia.
6 Segundo Bruno, Reinaldo Moreira. Op. Cit. P 317. “Portanto, para que essa apuração seja realizada em conformidade com o ordenamento, principalmente o disposto no Art. 5º, LIV, é necessário que se dê em processo administrativo, no qual sejam observados os princípios fundamentais e assecuratórios da legalidade e legitimidade das ações administrativas.”
7 Estes sucedem aquele, são sucedâneos ao anterior e preexistente Judicial. Ou seja, urge que haja um primitivo, primeiro, anterior, precedente processo judicial condenatório restritivo de liberdade superior a dois anos e transitada em julgado, para o posterior processo administrativo de natureza disciplinar sobre a estabilidade ou não e desvinculo funcional jurídico ou não do castrense estadual caetés condenado, é a ilação a que se chega dos preceitos fundamentais da CF/88. Porém, a prática tem sido outra.
Continua…
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